Fonte: Folha de S.Paulo
Repartir patrimônio pode reduzir custo de
transmissão de 10% para pouco mais de 4%, alíquota do imposto
Com custo baixo, testamento é única forma de
beneficiar pessoas fora da linha de herdeiros após a morte
TONI SCIARRETTA
DE SÃO PAULO
O assunto é tabu nas famílias, os
supersticiosos temem mau agouro, mas não são poucas as disputas envolvendo
heranças. Para reduzir as despesas e facilitar a vida dos que ficam, bancos e
gestores patrimoniais recomendam dividir os bens ainda em vida, fazer um
testamento e ter seguro de vida.
A decisão é mais importante quando envolve
casamentos não oficializados, casais do mesmo sexo, filhos reconhecidos após
exame de DNA ou se pretende beneficiar diferentemente os herdeiros.
Tanto em vida como após a morte, incide na
partilha o ITCMD (Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação). Em São Paulo, a
taxa é de 4%.
Pouca coisa pode ser feita para pagar menos
imposto, mas evitar um processo judicial reduz os custos totais da partilha com
advogados, peritos e cartórios, além de tributos, de 10% para pouco mais de 4%
dos bens.
Quem reparte bens entre os herdeiros foge da
sucessão prevista no Código Civil e pode colocar cláusulas para garantir o
usufruto (ter posse e uso enquanto viver), além do respeito de sua vontade após
a morte.
A inalienabilidade e a impenhorabilidade
impedem que bens herdados sejam vendidos ou dados como garantia de empréstimos.
A incomunicabilidade evita que a herança vá para os cônjuges se o herdeiro
morrer.
TESTAMENTO
Para deixar algo a alguém que não seja herdeiro
(amigos, entidades etc.), a pessoa deve fazer um testamento.
No documento, só é possível dispor de até
metade dos bens como desejar; a outra é dos herdeiros.
"Testamento não é só para rico. É um documento
simples que qualquer um pode fazer", diz a advogada Ivone Zeger, autora de
"Herança: Perguntas e Respostas".
O testamento pode ser feito de forma
particular, no cartório, na presença de três testemunhas, por cerca de R$ 10. As
testemunhas, nesse caso, devem estar presentes para confirmar, em juízo, quando
o testamento for aberto.
Mais seguro é fazer um testamento público,
também no cartório, a um custo de pouco mais de R$ 1.000, em que as declarações
são registradas por um tabelião na presença de duas testemunhas.
"As partilhas são confusas, mas podemos evitar
dor de cabeça deixando resolvido", diz Marcos Fioravanti, do escritório Siqueira
Castro.
Fundos de previdência dão herança sem
imposto
Beneficiário de VGBL não paga tributo de
transmissão, só o Imposto de Renda
Cartórios podem fazer inventários sem
disputas de herdeiros fora da Justiça em prazos menores
DE SÃO PAULO
Criados com o objetivo de facilitar as
sucessões patrimoniais, os fundos de previdência privada do tipo VGBL (Vida
Gerador de Benefícios Livres) permitem ao segurado eleger um ou mais
beneficiários para receber o saldo acumulado em caso de morte.
A vantagem é que esse saldo é transferido
diretamente para o beneficiário sem passar pelo inventário e sem o pagamento do
ITCMD (Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação). Nele, incide só o Imposto
de Renda pelo ganho que o próprio segurado teria de pagar caso recebesse o mesmo
benefício.
Isso acontece porque o fundo funciona como um
seguro de vida, sobre cuja indenização não incide imposto de doação ou de
transmissão.
Apesar de não reduzir a base de cálculo do
Imposto de Renda, os fundos VGBL são os que mais crescem também por facilitar a
sucessão patrimonial. Eles são indicados para quem faz a declaração simplificada
do IR.
No ano passado, captaram R$ 43,3 bilhões (18%
mais do que em 2010), enquanto os PGBL (que reduzem a base de cálculo do IR,
indicados para quem faz declaração completa) receberam R$ 6,9 bilhões (alta de
13,5%).
RAPIDEZ
"O VGBL é o único meio para não pagar imposto.
E sai rápido o benefício. Fazer esse planejamento em vida é mais fácil e barato
para todos", diz Beto Domenici, estrategista da gestora Rio Bravo.
"Inventário por via judicial com briga é sempre
caro", diz Natalia Zimmerman, advogada do "private bank" (gestão de fortunas) do
Santander.
Pouca gente sabe, mas é possível fazer
inventário no cartório, como ocorre com os divórcios desde 2007.
Mas isso só vale se não existir testamento
(precisa ter certidão negativa), se todos os herdeiros estiverem de acordo, não
houver crianças nem pessoas consideradas incapazes (deficientes intelectuais) na
divisão do bolo e se pessoa que morreu não tiver dívida tributária.
ADVOGADO
Nos cartórios, as partilhas devem ser
acompanhadas obrigatoriamente de um advogado. Em ambos os caminhos (judicial ou
extrajudicial), o prazo para dar entrada é de 90 dias da morte.
Segundo Roberto Justo, advogado do escritório
Choaib Paiva, pouco pode ser feito para reduzir os impostos, mas algumas pessoas
pagam mais do que precisariam.
"É possível estudar como pagar menos imposto e
garantir que a vontade do cliente seja feita após sua morte."
(TONI SCIARRETTA)
Perguntas e respostas sobre
heranças
1. Quem faz testamento pode deixar bens para
quem quiser?
Quem tem filhos, netos, pais ou cônjuge precisa
obrigatoriamente reservar 50% do que possui a eles. Só a outra metade pode ser
disposta livremente conforme a vontade da pessoa. O testamento só vai dispor de
todos os bens caso não haja herdeiros descendentes, ascendentes, irmãos e
cônjuge.
2. Os herdeiros são obrigados a pagar as
dívidas da pessoa que deixou a herança?
Sim, desde que a dívida não ultrapasse o valor
total da herança. A exceção são as dívidas fiscais e trabalhistas.
3. Quem vive junto, mas não é casado, tem
direito à herança do companheiro?
Sim. Se o relacionamento for uma união estável,
mesmo que não seja oficializada em cartório, o companheiro tem direito à metade
dos bens adquiridos após a união. Só não terá direito se a união estável
estipular a separação completa de bens.
4. Quem não tem filhos deixa tudo para o
viúvo?
Não. Se a pessoa que morreu tiver pais, avós ou
bisavós vivos, o cônjuge terá de dividir a herança com esses herdeiros.
5. Filhos fora do casamento são
herdeiros?
Sim. Desde que a paternidade seja comprovada, a
herança será igual à dos demais filhos. Filhos adotivos também são
herdeiros.
6. Irmãos têm direito a herança?
Só se a pessoa que morreu não tiver
descendentes e ascendentes. Se tiver pais ou filhos, a herança é deles.
7. Amante de homem casado tem direito a herança
se for mencionada no testamento?
Não. Mesmo que o morto deixe, no testamento,
algo para a amante, os demais herdeiros podem pedir a exclusão da beneficiada
argumentando que se trata de uma relação impura. A única exceção é se o homem
tiver se separado, de fato, por cinco anos e se a amante não tiver sido a causa
da separação.
8. Como fica a herança de quem não tem
herdeiros?
Fica para o Estado. Fazendo testamento, é
possível dispor de tudo como bem entender.
9. Como fica a herança de quem casou com
comunhão parcial de bens?
O cônjuge sobrevivente tem direito à metade do
que foi adquirido durante o casamento (meação) e a parte do que foi adquirido ou
herdado antes do casamento (a herança), que deve ser dividida com os demais
herdeiros.
10. Divorciados têm direito à herança do
ex-cônjuge?
O ex-cônjuge não tem direito se a sentença do
divórcio já foi publicada e a partilha dos bens foi feita.
11. Quem herda é obrigado a pagar
imposto?
Sim. Incide o estadual ITCMD (Imposto sobre
Transmissão Causa Mortis e Doação), que, em São Paulo, é de 4% dos bens
inventariados. Estão isentos os imóveis residenciais até R$ 92,2 mil (5.000
Ufesp).
12. O pai pode deserdar um filho no
testamento?
Não. Só se o filho tiver matado (ou tentado
matar) o pai ou tiver ocorrido alguma ofensa gravíssima à dignidade da
pessoa.
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